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Tendo começado como uma mera brincadeira e por alguma curiosidade, ao longo dos anos tenho colaborado com diversas revistas e jornais relacionados com a Caça, como articulista, cronista, tendo até ao momento mais de meia centena de textos publicados em várias revistas e jornais de âmbito nacional, nomeadamente nas revistas "Calibre 12", "Caça & Cães de Caça", "Caça Maior e Safaris", "Extra Galinhola" e Jornal "A Nossa Caça".  Esta página destina-se a divulgar alguns desses textos anteriores, e outros que eventualmente me sinta impelido a "escrevinhar".

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(Posted 2015/11/29)


Galinholas do meu Encanto!


 

Introdução


            Falar de Galinholas actualmente nunca será acautelar demasiado, já que se trata de uma modalidade que envolve uma grande paixão e carga sentimental, sendo em consequência interpretada de forma muito particular por cada caçador. De tão apaixonante, há quem se lhe dedique em exclusivo ou quase, sendo por isso referida com frequência como modalidade de especialistas.

            Pessoalmente, não existe Época que não lhes dedique uma boa meia dúzia de jornadas e partilho da opinião de que se trata de facto de uma espécie muito particular e que merece ser apreciada com todos os requintes. Matar Galinholas enquanto se caçam coelhos, de batida ou como muito comum no passado em alguns locais, á passagem, não é de todo a forma como a Galinhola deve ser encarada. Disso não deve existir a menor dúvida, sendo seguramente consensual entre quem se dedica com maior ou menor profundidade a esta Caça!


Caça de Especialistas

Porém, como caçador, eventualmente talvez denominado de generalista, se tivermos que dar um nome a quem caça não a tudo, mas a um largo conjunto de espécies, não a sinto, em boa verdade, como modalidade exclusiva ou apenas reservada a especialistas. Muitos serão os caçadores nestas mesmas condições, que motivados por uma paixão legítima á Galinhola a encaram com máximo respeito e lhe procuram corresponder em ética, conhecimento, o imprescindível cão de parar e a necessária cota de dedicação sazonal.

Figuradamente, no Universo da Caça, a Galinhola é verdadeiramente um Mundo por conhecer, e a cada um cabe a forma de o fazer se for caso disso, se de avião, de barco ou a pé, viajando todos os dias ou descansando de permeio, intercalando com outras actividades, conforme cada um possa ou assim o deseje.

 

            Como em quase tudo na vida, a Galinhola começa também por uma descoberta, que tende a alimentar uma interminável fase de aprendizagem, sobre a mesma, os seus territórios e sobre os cães de parar, pautada de sucessos e insucessos, bons e maus dias, boas e más épocas – mas sem dúvida uma marcante e agradável experiência enquanto caçadores, predispostos a essa viagem.


 

A presença de Galinholas

A densidade de Galinholas depende muito das condições climatéricas, sobretudo as associadas ou que influenciam a sua migração, assim como as que condicionam o estado do próprio terreno e coberto vegetal, dos locais que supostamente as terão de acolher, como hóspedes temporárias. Por vezes, coincidindo com as suas “entradas” deparamo-nos com densidades absolutamente anormais e que duram apenas escassos dias. Após esse curto período, imediato á sua chegada, ainda “agrupadas”, estas tendem a redistribuir-se pelos novos territórios recém alcançados. Nas “saídas” este fenómeno também parece suceder, justificando ocasionalmente excelentes resultados em jornadas tardias.

De ano para ano, com base em todas essas variáveis, incluindo igualmente o número de abates realizado na zona de caça, a densidade desta espécie mostra flutuações, na maioria dos casos acentuadas. Por esse facto é necessário manter um acompanhamento “apertado” á zona de caça vigiando os locais de maior crença.

 


Os Terrenos

            Os terrenos típicos de Galinhola terão de proporcionar alguns aspectos importantes, sossego, abrigo e alimentação. Assim, é comum encontrá-las em bosques de folhosas ou mesmo em pinhais, quase sempre densos, sombrios, que lhes proporcionem por um lado abrigo e sossego, por outro um manto de matéria orgânica húmida, onde se desenvolva um banquete, rico de larvas, minhocas, etc. acessível á prospecção dos seus longos e adequados bicos. É comum estes mesmos bosques intercalarem com prados alagadiços, onde preferem realizar os seus passeios gastronómicos nocturnos. Alimentando-se nesses espaços abertos, a Galinhola deverá sentir-se talvez mais defendida de alguns predadores. Nas suas orlas e em determinadas condições de consistência do solo é possível detectarmos sinais da sua presença, quer marcas das suas patas, quer os “buraquitos” realizados pelo seu bico. Em terrenos de esteva ou fetos, com alguma crença de galinholas, não se tratando de cobertos muito altos, embora por vezes muito densos por cima, é de realçar tratarem-se de cobertos necessariamente abertos ao nível do solo, proporcionando-lhe mobilidade e todas as condições referidas á sua alimentação.

 

Porquê caçar a Só ou com apenas mais 1 ou 2 espingardas?

Precisamente porque a Galinhola não se encontra distribuída uniformemente, mas quase confinada a locais específicos na maioria das vezes de pequena dimensão, as chamadas zonas “quentes”. O caçar em linhas maiores, “batendo” amplas faixas de terreno a eito não faz por isso qualquer sentido, a não ser talvez numa fase inicial de prospecção/exploratória dessas zonas “ quentes”. Por outro lado, a presença de um número elevado/maior de elementos torna o sossego e cuidado necessários ás “aproximações“ a esta espécie praticamente impossíveis (interferência dos vários cães uns nos outros, concentração caçador/cão a níveis mais baixos, mais ruído em geral, etc.) e nessas condições as desejadas paragens, podem substituir-se a apenas levantes antecipados, impossibilitando o desfrutar dos lances.

 



O Cão de Parar

A importância de um cão de parar na caça á Galinhola é mais do que evidente, fundamental por tudo o que foi dito atrás. Dado o tipo de terreno, normalmente muito difícil (sujo, fechado, com obstáculos, ...) dificultando a nossa progressão e colocação, dificultando de sobremaneira as condições em que se atira e a acção do próprio tiro é de todo indispensável a colaboração de um cão de parar com sensibilidade “capaz” para as Galinholas. Para além de as localizar/sinalizar um cão de Galinholas tem de ter o cuidado essencial de as conseguir “aguentar” - o que ainda assim nem sempre acontece. Um cão de parar para as Galinholas terá de conciliar um carácter combativo, enérgico, de plena entrega, inerente a um bom desempenho num tipo de cenário de grande dureza e adversidade com a crucial ligação ao seu amo e a fina cautela imprescindível á paragem da Galinhola.

O cobro é por fim outra das qualidades de destaque e que forçosamente deve fazer parte de um (bom) cão de Galinholas. Perder uma Galinhola num terreno típico desta caça não será claramente difícil se ousássemos cobrá-la sem qualquer ajuda.

Como se depreende um cão de Galinholas tem de ser á partida um animal muito completo e por isso sem dúvida bastante especial para o caçador.

 



Notas finais

Baseado na sua maior experiência e conhecimentos técnicos incontestavelmente mais profundos, fruto de uma dedicação específica e intensiva, muitos outros estariam mais á altura de escrever um texto sobre a Galinhola e a sua Caça. Por esse motivo, estas linhas não representarão mais que uma versão afectuosa de comum Caçador para Caçador sobre o assunto, mas que pretende por essa via transmitir e assegurar que, mais ainda serão aqueles, os que podem vir a conhecer e a experimentar o encanto desta ave enigmática, enriquecendo ou complementando-se enquanto caçadores, ainda que não necessariamente caçadores em exclusivo de Galinholas.

            As jornadas de Caça a esta espécie têm um carácter peculiar de “encantamento”. Na solidão da sua busca e desses fascinantes “encontros” resultam por vezes lances de inenarrável beleza. Desses hiatos de paz e felicidade guardam-se deliciosas memórias, que irrompem frequentemente ao pensamento como se tivessem vontade própria em ser recordadas e que me aflige um dia vir a perder. Admitindo essa inquietação e no constante desejo lhes acrescentar sempre mais um lance passei por isso, no meu íntimo, a apelidá-las de “Galinholas do meu Encanto!

 Um abraço a todos os que sentem alguma “atracção” pelas Galinholas!

...aos que sofrem, ou virão ainda a sofrer do seu encanto.

 
“Aos meus amigos Carlos Ferreira e Beto, ao primeiro como grande responsável pelo meu encontro com as Galinholas, ao segundo como companheiro com quem tantas vezes as tenho caçado, a todos quantos tenho escutado da sua experiência sobre o assunto, aos cães que tive e que ainda tenho, a Kikas, a Alorna, o Bizarro e agora á Aia, com quem ao longo dos anos esta amena aventura tem acontecido!


 

Como simples curiosidade, recordo amiúde relativamente á “Caça á Galinhola”, a passagem nostálgica do Romance “Rio das Flores” de Miguel Sousa Tavares, quando a dada altura este relata o falecimento do patriarcal Manuel Custódio, enquanto caçava Galinholas na companhia de seus filhos, num lance de sóbrio e fiel detalhe sobre a mesma. Eventualmente, apenas sentida com a intensidade desejada por quem caça de paixão e conhece as Galinholas, trata-se de um momento sublime, que não deixará muitos caçadores indiferentes.

 

“Teve morte de Caçador, num dia em que saíra para caçar Galinholas, a sua caça favorita, acompanhado pelo seu braque, o “Campeão”, pelos dois filhos e pelo feitor da herdade, o Tomé da Amieira. Caçavam num terreno “sujo” e difícil, um entranhado de silvados e arbustos altos, onde a custo ele se embrenhava, arranhado nos braços e na cara e mantendo a espingarda ao alto, por cima da vegetação. Extenuado, tinha acabado de chegar ao cimo de um cerro íngreme, quando ouviu o ligeiro silvo da galinhola, levantando do chão onde estava oculta e partindo disparada, no seu característico voo aos ziguezagues por entre as árvores, tornando quase impossível um tiro certeiro. Mas apesar do cansaço, ele reagiu rápido e por instinto: apontou, meteu-a em mira, calculou numa fracção de segundo a sua trajectória, “corre a mão” para diante e disparou para um ponto á frente dela. Fulminada, a ave caiu “seca” e, no mesmo instante, o Campeão lançou-se para a cobrança.

E foi aí, no alto desse cabeço, que Diogo foi o primeiro a dar com o pai, minutos decorridos. Manuel Custódio jazia de joelhos, com a espingarda caída à sua frente e a cabeça apoiada na terra, em estranho equilíbrio. Junto a ele, o Campeão gania baixinho, a galinhola morta a seus pés, e com a língua lambendo suavemente a nuca do dono.”

(In "Especial Galinhola", Novembro 2009)


(Posted 2015/09/24)

 
A extinção do Coelho Bravo e as suas consequências






O Coelho-Bravo está praticamente extinto mas as forças dos vários quadrantes para além das directamente ligadas à Caça e Gestão Cinegética tardam em assumi-lo e em unir os necessários e proporcionais esforços para a sua recuperação, como nunca se justificou tanto! Provérbios como, “O pior cego é aquele que não quer ver” ou “o que os olhos não vêem, o coração não sente”, parecem descrever a situação.

 Após já mais de três décadas de prevalência das duas principais doenças que afectam o coelho bravo em Portugal, o panorama é neste momento o mais negro de sempre. O coelho bravo atingiu a quase extinção! O nível actual das populações de coelho bravo devia ser o alarme último e o factor de união de todas as “forças” no sentido de reverter o seu declínio. Tudo e todos estão já a perder muito, e iremos perder muito mais. Não será de outra forma.

MIXOMATOSE E DHV (Doença Hemorrágica Vírica)

A Mixomatose presente na Península desde os anos 50, quando foi detectada pela primeira vez, deixou fortes marcas em Portugal, sobretudo entre finais da década de 70 e inicio da década de 90. Alguns autores estimam que os surtos iniciais chegam a devastar cerca de 90 % das populações iniciais. Durante este período a taxa de mortalidade provocada pelos surtos iniciais de Mixomatose começa a diminuir, mas a partir de finais da década de 90 surge outra doença devastadora, a DHV (Doença Hemorrágica Vírica). Em consequência desta nova doença estima-se que na Peninsula as populações tenham regredido para 55 a 75% das populações até aí existentes, em muitos casos já substancialmente reduzidas. A Mixomatose e DHV passam a coexistir na maioria das regiões. As populações não serão desde aí mais que 5-10 % dos valores iniciais (Pré-Mixomatose).

Note-se que os cenários e evoluções descritas não acontecem em simultâneo, nem ao mesmo ritmo em todo o País, revelando nalguns casos até mais de uma década de diferença temporal, entre diferentes regiões.

 
O SUL DO PAÍS E A NOVA DHV

Ainda assim, o sul do nosso país consegue “aguentar” zonas de melhor densidade de coelho. E mesmo em zonas mais a norte, decorridos alguns anos do surgimento destas doenças, os coelhos pareciam recuperar gradualmente. No entanto, em finais de 2012 - início de 2013, surge uma nova variante da DHV ainda mais letal provocando niveis de mortalidade superiores e atingindo coelhos juvenis, não afectados pela DHV até aí existente, e que por isso nunca chegarão sequer a procriar. Esta variante vem provocar estragos ainda mais severos nas populações de coelho, não “respeitando” sequer as zonas que até aí conseguiam resistir ao virús, sendo reportadas perdas massivas nas populações de coelho no Sul do País. Curiosamente, é reportado em Espanha que a anterior variante da DHV deixa mesmo de ser detectada no campo, facto que preocupa actualmente quanto ao desenvolvimento futuro de possíveis vacinas (e em curso).

ESFORÇOS PARA REVERTER O DECLÍNIO

Ao longo destas décadas, ensejando recuperar o coelho bravo, e sobretudo de conseguir resultados à semelhança dos anos de maior abundância, por parte de caçadores e gestores cinegéticos decorreram repovoamentos de coelho em muitas zonas de caça (muitos completamente descontrolados). Muitos destes repovoamentos destruiram, quase na totalidade, as populações de coelhos locais, e acentuaram a progressão destas doenças. Ainda que, vendedores ou compradores, tranquilizassem com a condição “limpa” dos coelhos e com acções de vacinação, em muitos casos, apenas imediatamente antes das soltas. Até hoje, muitas dessas zonas continuam a padecer, quase vazias, se não mesmo extintas. Atestam especialistas que os esforços devem incidir sobre os vectores de transmissão das doenças, e melhoria dos habitats, eventualmente num menor controlo sobre os predadores, eles próprios ameaçados pela escassez de coelhos, mas eficazes como controlo sanitário das populações, e através de uma redução significativa da pressão de caça. Estas as áreas que devem merecem mais atenção!



ALGUNS EFEITOS COLATERAIS

>IMPACTO NAS PERDIZES (E OUTRAS ESPÉCIES CINEGÉTICAS)

Numa fase inicial, em virtude do decréscimo acentuado das populações de coelho, e dos esforços infrutíferos na reversão do declinio do coelho bravo, muitos caçadores passaram a dar mais atenção a outras espécies, onde se destacam as perdizes, ainda abundantes em algumas zonas. No entanto, sendo ainda mais vulneráveis em termos de pressão cinegética que os coelhos, passaram na maioria dos casos, também à (quase) extinção. Este facto foi igualmente reconhecido em França e na vizinha Espanha.

O aumento significativo do número de caçadores (a caçar à perdiz), acompanhado pela alteração de práticas agrícolas, abandono gradual do mundo rural, conduzindo à consequente perda de habitats adequados terão igualmente contribuído para o rápido declínio da Perdiz.

>A CAÇA DE CATIVEIRO E OS CÃES DE PARAR

Ocorre neste período o apogeu das perdizes criadas em cativeiro e dos repovoamentos de perdiz. Também a disseminação em larga escala dos cães de parar entre os caçadores portugueses, das provas de Santo Huberto, das caçadas em campo de treino (com caça de cativeiro) e das largadas. Como em tudo, as crises são igualmente momentos de oportunidade para alguns. Mas esse aspecto não é o motivo deste texto. Estas actividades terão um efeito positivo se reduzirem a pressão real ou efectiva de caça sobre as espécies selvagens.

Para que não percamos o tema deste texto, e procurando fazer a ligação causal, é importante realçar que na génese de toda esta sequência de eventos está a decadência severa do Coelho Bravo (ainda que simultaneamente acompanhada de outros efeitos).

>A EXPANSÃO DA CAÇA MAIOR (CONSEQUÊNCIA E CAUSA DO DECLÍNIO DO COELHO)

Mas não é só. Simultaneamente, com impacto também no declínio das populações de coelho e perdiz, inicia-se outra mudança de vulto, no panorama cinegético nacional, a expansão da caça maior em Portugal. Esta tem origem também em vários factores como a expansão das grandes manchas florestais, episódios pontuais como grandes incêndios (forçando à deslocação dos animais), o abandono agrícola, a protecção oferecida pelas ZICs (Zonas de Interdição de Caça) associadas aos grandes Parques Naturais, e também alguns repovoamentos (ainda que um factor menor). Existirão possivelmente outros, como numa fase posterior e mais recente, até mesmo a elevada pressão de caça. Se é hoje facilmente confirmado que a presença de veados, gamos, muflões, e mesmo o corço, é reconhecida em geografias onde não se verificava no passado, como é do conhecimento geral, a expansão da caça maior tem o seu expoente máximo na omniprença do javali praticamente em todo o território nacional, vinda desde os seus redutos históricos, das zonas raianas, até às praias, aos parques naturais, às matas e jardins junto às cidades e povoados. A sua proliferação é hoje um dos factores de pressão também sobre a recuperação do coelho bravo.

Em consequência destas alterações ocorre a explosão de caçadores-monteiros e esperistas, atrevendo-me a dizer que poucos serão os que hoje em dia nunca frequentaram uma montaria ou nunca experimentaram a fazer uma espera aos javalis. E é certo, outros passaram a caçar de aproximação, a caçar veados, gamos, muflões e corços. E muitos em virtude de tudo isso passaram ainda a caçar no estrangeiro.

Hoje em dia o fenómeno associado à Caça Maior poderá ser visto simultâneamente como consequência do declínio severo do coelho bravo e em certa medida como causa desse declínio e da sua difícil recuperação.

>CAÇADORES E CÃES COELHEIROS

Sendo um pouco mais atrevido, suspeito que o impacto não se terá ficado por aí. Com o declínio do coelho bravo em Portugal, os caçadores de coelho terão igualmente “caído a pique”, os criadores de podengos e raças dedicadas à caça ao coelho terão reduzido significativamente o seu esforço e investimento. Os efectivos de cães dedicados à caça aos coelho detidos por caçadores serão hoje, também eles, muito menores.

Sobre os cães, é certo que aumentaram os cães destinados à caça maior e cães de parar neste período. Ou seja mais uma vez, nem tudo foi mau, para todos – como sempre acontece em qualquer alteração significativa.


COELHOS E PREDADORES À BEIRA DA EXTINÇÃO...

Não só os coelhos estarão no limiar da sua existência. Como sabemos, também os seus predadores naturais, não passam melhores dias. Recordo por exemplo os casos mais emblemáticos do Lince Ibérico, ou de diversas aves de Rapina. Recordo projectos conservacionistas que como é óbvio nunca terão sucesso ou este será substancialmente limitado, para além de muito provavelmente mais onerosos, sem a recuperação da “pedra de base”, o Coelho Bravo.

O Coelho-Bravo é elemento importantissímo dos ecossistemas mediterrânicos sendo considerado presa de pelo menos 27 aves de rapina, 11 espécies de carnívoros e 2 espécies de serpentes, onde se destacam como espécies mais emblemáticas, o lince ibérico e a águia imperial, ambas em vias de extinção, em parte devido à diminuição da sua presa principal, o coelho.

... TAMBÉM PODENGOS E CAÇADORES DE COELHOS ESTARÃO À BEIRA DA EXTINÇÃO

Como muitos dos que se encontram na faixa dos 40 e acima, iniciei-me na caça ao Coelho, que ainda hoje pratico, em conjunto com gente de grande paixão pelo coelho bravo. Paixão essa que se traduz por um trabalho constante na busca dos melhores cães, dos melhores podengos, pela busca das melhores zonas de caça ao coelho, e por isso não posso deixar de questionar também, que dada a situação actual e não havendo uma inversão súbita da mesma, o que será do nosso Podengo dentro de poucos anos? E do predador-humano? também os caçadores de coelho estarão à beira da extinção. Pergunto-me se serão os seus actuais caçadores os últimos caçadores de coelhos? Efectivamente.

ALERTAS DAS OSC NÃO CORRESPONDIDOS, PELO MENOS NA DEVIDA MEDIDA

Várias são as Associações e Organizações, sobretudo as do Sector da Caça que têm alertado para o problema. Mas, seria de facto importante que os decisores políticos relevantes e as mais variadas associações com influência no sector (Ambiente, Caça, Floresta, Agricultura, etc) tivessem verdadeira noção que o Coelho é de facto a chave, uma peça motora da dinâmica ecológica, e também cinegética. Muito ficariam a ganhar com a recuperação do Coelho-bravo, todas estas entidades e as áreas a que pertencem, também a Ecologia, o sector da Caça e a Economia do País. Apenas os que, na verdade, não querem saber ou nada sabem deste assunto, conseguem ficar indiferentes a um problema desta gravidade.

CAUSA COELHO BRAVO! A UNIÃO FAZ A FORÇA... MAS É PRECISO QUERER

Porque não? Estado, Associações Ambientalistas e da Conservação, OSCs e Caçadores unirem esforços, numa causa única e com carácter de urgência. Infelizmente para todos, provérbios como, “O pior cego é aquele que não quer verouo que os olhos não vêem, o coração não sente”, parecem descrever a situação. Para quando um verdadeiro Plano Nacional Integrado de Recuperação do Coelho Bravo? Amanhã será tarde demais para o Coelho Bravo, para muitas das espécies altamente ameaçadas que dele dependem, e é verdade, também para os canicultores e caçadores que se lhes dedicam!


Quantos milhares concordaremos sobre este assunto? Seguramente muitos, pena que não os suficientes a convencer os decisores certos, do nível e extensão do envolvimento e investimento necessários.
 


Algumas referências:

Simões, P. 2014. Salvemos o Coelho Bravo. FENCAÇA. Disponível através do site,


Reis, T. 2013. CIBIO identifica variante de vírus letal para o coelho-bravo. Noticias Universidade do Porto. Disponível através do site,


Oliveira, J. 2012. Caracterização da produção de Coelho Bravo em Cativeiro na Região Norte de Portugal. Dissertação para obtenção de Grau de Mestre em Engenharia Zootécnica. UTAD, Vila Real. Disponível através do site, https://repositorio.utad.pt/bitstream/10348/2540/1/msc_jagoliveira.pdf

Otero, S. 2010. Coelho-bravo, espécie-chave dos ecossistemas mediterrânicos. Disponível através do site,


Ward, D. 2005. Reverter o declínio do coelho bravo – Um dos maiores desafios para a conservação da natureza em Portugal e Espanha. Disponível através do site,


 

Otero, S. ???? (data publicação não identificada no artigo). O Declínio das Populações de Coelho em Portugal. Disponível através do site,


 

Ferreira, C. ???? (data publicação não identificada no artigo). A situação do coelho-bravo na Península Ibérica: implicações para a Conservação do Lince-ibérico. REC-UCLM & CIBIO-UP. Disponível através do site,


 

(In Caça & Cães de Caça, Agosto 2015) 


(Posted 2015/08/10)

As últimas Galinholas...

A atravessar uma fase de algum cansaço acumulado, e também algo desmotivado com as “Galinholas”, confesso que à partida a vontade de caçar não era assim tanta.

A verdade é que num ano seguramente medíocre de Galinholas, acabara de ser diagnosticada uma doença degenerativa ao “Pirata”, e que o afastou definitivamente da Caça em escassos meses. Setter Inglês, já com 4 anos, este era o cão mais experiente à altura, sendo um cão muito razoável nas Galinholas. Uma pena e motivo de alguma desilusão, dada a progressão e maturidade recente deste cão na busca, mostra, cobro, ligação comigo, ainda que não tendo sido um cão muito precoce. Mas, como em tudo o resto, a vida tem de continuar e neste caso, através de outras “promessas”. Com ele havia caçado não hà muito tempo a sua última Galinhola. E ficará a recordação de um bom cão e excelente companheiro. Onde quer que esteja agora, que cace muitas mais, com a paixão que lhe conheci.


Ainda assim, a ideia de faltar a este dia estava a pesar-me na consciência. No fundo, tratava-se da “despedida” de uma época, em que havia caçado apenas escassos dias às galinholas, comparativamente a outras Épocas, e algo me dizia que não devia desperdiçar a última jornada.
Por isso, acabo por viajar para Pedrógão d`Aire de véspera e planeei levantar-me não muito cedo, já que fazia seguramente bastante frio durante a noite/amanhecer, deixando o relógio despertar apenas às 08:30h. Ainda assim, acedo a fazer o que o corpo me pedia, DESCANSAR!

Levantei-me apenas cerca das 10:30h, tomei um bom pequeno almoço, café, pão do dia, etc. e lá preparei as cadelas e os apetrechos da ordem. Decidi levar as duas bretons, a Uva e a Bolota. Sendo ambas generosas e abnegadas na busca, a Uva é a mais “sensivel” das duas, oferecendo guias e paragens de bom nível. No entanto, ambas inexperientes no que toca a Galinholas.

Enfim, lá saí de casa, já cerca das 11:00h. Tardissímo, mas estranhamente sem pressas...

Fiz a passagem habitual pelo café, onde os “tordeiros” daquela manhã fria já se encontravam nos lamentos, também já habituais esta época. Talvez o pior ano de sempre em termos de Tordo por aquelas paragens. E na minha opinião, também equiparado, muito fraco mesmo, em termos de Galinholas.
Depois de perceberem que não tinha ido caçar, mas que ainda o tencionava fazer, alguns dos que me são mais próximos gracejam da minha “madrugada”.
Galinholas de passagem ou abatidas de forma fortuita,
Época após época continuam a repetir-se relatos, um pouco por toda a parte, que durante jornadas a outras espécies, normalmente aos tordos de espera, mas também noutras jornadas, estas são abatidas de passagem ou em consequência de levantes fortuitos, por vezes consequência de grandes ajuntamentos de caçadores em jornadas de caça às migratórias de Inverno ou casualidade. Sobre este facto, seria positivo que gradualmente a Galinhola passasse a ser mais respeitada pelos caçadores que não as caçam com cão de parar. Sendo da opinião, que não o façam pela carne em si e acreditando que estes caçadores nada têm a provar em termos de capacidade ou qualidade como atiradores, a si mesmos ou aos outros, porque não respeitar uma ave tão emblemática e tão mais bela quando caçada com cães de parar? Ainda que a Galinhola seja peça apreciada à mesa, não será uma galinhola ou outra por Época que fará qualquer diferença para o caçador que as abate assim – já se alguns milhares de caçadores ou largas centenas abaterem 1-2 cada um, quando não mais, isso terá certamente um impacto considerável. Gostando ou tendo curiosidade pela espécie, não seria preferível experimentarem a caçá-las mesmo, do que simplesmente matá-las? Julgo que até mesmo esses caçadores, de uma forma ponderada e racional, conseguirão de forma geral concordar que estas deviam ser caçadas, apenas e só, de salto e quando caçando com cão de parar (admitindo cães cruzados dessas raças). E nesse sentido a Lei devia ser mais explícita sobre a não possibilidade da sua prática de espera, à passagem, ou fortuitamente de salto sem cães, ou mesmo de salto durante a caça aos coelhos, por exemplo. A bem da preservação, gestão e da ética na Caça à Galinhola, mais do que desejável, não será mesmo necessário que as Associações ligadas à Caça promovam esta discussão e se considerado adequado promovam uma melhor regulamentação?
O que diz a Lei sobre a Caça à galinhola?
De acordo com a Lei de Bases Gerais da Caça, e redacção conferida pelo Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de Agosto, alterado pelo Decreto-Lei nº 201/2005, de 24 de Novembro, publicados pelo (antigo) MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, DO DESENVOLVIMENTO RURAL E DAS PESCAS, refere o,
 
Artigo 100.o
Caça à galinhola
1—A caça à galinhola pode ser exercida de salto.
2—O exercício da caça a esta espécie pode ser permitido
nos meses de Outubro a Fevereiro, inclusive,
nos termos definidos anualmente na portaria que estabelece
o calendário venatório, sem prejuízo do disposto
no número seguinte.
3—Em terrenos cinegéticos não ordenados, nos
meses de Janeiro e Fevereiro, a caça a esta espécie
só é permitida nos locais e nas condições estabelecidos
por edital da DGRF.
Enfim, hà dias para tudo, e lá segui direito à Serra, onde me propus fazer apenas uma pequena zona de mato com manchas de pinhal e que considero das melhores zonas de Galinholas daquela zona de caça. Seria já próximo do meio dia quando começo a explorar a dita zona.

Não teria passado um quarto de hora, quando me deparo subitamente com a Uva em mostra, apontando ao meu lado direito. Dou alguns passos ao lado, procurando o melhor alinhamento com o possível levante e .... pah, pah, pah...

Acrobática, a galinhola eleva-se a pique entre umas urzes altas, cruzando as ramagens mais despidas dos pinheiros, ainda assim com boa visibilidade. Ao pensamento assalta-me num segundo, a sorte com que aquele lance me brindava. Talvez desse encanto, hipnotisado pelo momento, penso que lhe coloco o primeiro tiro por baixo, observando-a egoistamente por cima do cano (verdadeiramente graciosa!), mas como é lógico, não evitando o que menos queria que sucedesse – não oferecer às cadelas o prémio de a cobrarem. No segundo tiro, já em piores condições e com tal decepção, errei a dita pela segunda vez, ainda que de forma mais justificada.

As cadelas percorrem toda aquela área, na esperança de que a pudessem cobrar. Quando se apercebem que de facto não estaria ali, fico com a sensação de que me olham com complacência, mas também com alguma desilusão.

Por sua vez, eu sinto apenas uma boa dose de vergonha...

Mas enfim, a caça é mesmo assim e restava apenas prosseguir e procurar outra. Coisa que fiz de pronto. Decidi ainda assim seguir a “linha” de fuga dessa galinhola e confirmar se teria ficado ainda na “ponta” do mesmo pinhal – coisa que me parecia possivel.

E assim fiz, caminho gradualmente pela orla fresca e mais sombria, onde o chão se apresentava ainda húmido. Ao voltar a entrar no pinhal confirmo a Uva a guiar até que se imobiliza. Já com a expectativa no limite, em escassos segundos – projecta-se novamente à minha frente, a desejada “Rainha do Bosque”.

Desta vez a preocupação no tiro era maior e dada a facilidade com que se apresentou, consigo oferecer o merecido prémio às minhas companheiras. Lindíssima! Conseguida num lance muito típico e de grande beleza, daqueles que fazem da caça à Galinhola uma caça muito especial e mágica, como frequentemente a adjectivam.

A Uva surge em escassos momentos com o cobro, mostrando ter levado também a melhor sobre a companheira Bolota. No entanto, nem sempre tem sido assim, e talvez por isso se apresentasse visivelmente vaidosa.

A verdade é que estava de facto de parabéns! Magnífico. Conseguiu todo um lance que me havia deixado muito confiante, quanto às futuras companheiras, para as “Galinholas”.

Para mim, havia significado também essa esperança, e uma pitada de nostalgia na época de despedida do Pirata.






Não o último dia, como precipitadamente ainda comecei a escrever, mas será seguramente o primeiro de muitos – nesta Caça tão apaixonante e onde os cães e a Galinhola são os verdadeiros protagonistas, e a que invariavelmente não consigo deixar de reservar algumas jornadas solitárias todas as épocas! Foi assim, o culminar das nossas incursões “Galinholeiras” da Época 2014/2015, uma caçada curtinha mas muito rica em emoção.




Local : Vale da Serra/Pedrógão
Data: 08/02/2015, último dia de caça às Galinholas da época 2014/2015
Tempo: Amanhecer muito frio mas dia solarengo, e quase sem vento
Cães: Uva e Bolota, ambas Epanheul Breton fêmea
Tiros: aprox. 20 metros
Arma: Pietro Beretta Silver Pidgeon 687 Sporting, 71 cm cano, quicks 4*/2*
Cartucho: Beccacia Mygra B&P, bucha feltro, 34 grs, chumbo 8,5
Galinholas: 2; das quais 1 errada e 1 cobrada


(In Caça & Cães de Caça, Junho 2015)

 
(Posted:2015/07/05)

Perdizes na Serra d`Aire: Aquelas que valem por “muitas”!

É meio da época e assalta-me a ideia de uma manhã às bravas “a solo” em plena costa da Serra d`Aire.

O José Pereira, meu grande amigo e com quem caço regularmente, jà hà 20 anos, avisou-me durante a semana, que não caçaria este fim de semana.

A possibilidade seria a ZCM de Bugalhos, caçando a área que conheço bem entre a aldeia de Vale da Serra, e a A1 (Autoestrada do norte na zona onde cruza a Serra d`Aire).

Contacto o guarda José Augusto e manifesto-lhe o interesse em fazer a manhã nessa zona. Sou informado que seria possível fazê-lo e que poderia matar “apenas”uma perdiz durante a manhã. Mais do que suficiente. Pois ali, só e ainda “sangue bravo”. E dado estarmos em meados de Novembro só mesmo muita sorte poderia representar mais que isso.

Aproveito uma deslocação, saio no nó da A1, em Torres Novas, encontro-me com o Sr. José Augusto, trocamos algumas impressões sobre o estado da Caça e dos Clubes, do decorrer da época e (como esperava) não ouvi as melhores notícias. Por fim peço-lhe algumas indicações e sigo para casa, já com a credencial passada para o próximo Domingo.

A família havia ficado o fim de semana de recato, dado os anúncios de mau tempo para o fim de semana. Então decido chegar de véspera a Pedrógão d`Aire e dormir em casa de meus pais, o que também ajudou à sensação de regresso ao passado.

Cresci no sopé desta Serra e dela guardo recordações de uma infância e juventude muito felizes. Também por ali cacei muitas vezes, até antes mesmo de “pegar” na espingarda.

As caçadas por ali, aos tordos, coelhos, galinholas, às perdizes bravas “de Serra” e javalis, são já de facto mais que muitas. E só o facto de guardar relatos e fotos de forma sistemática me permite, de forma consciente, ter a noção das muitas, e boas caçadas, que por ali tenho feito, seja a só ou acompanhado. Uma verdadeira maravilha, que perdura e me alimenta o sonho e vontade inabalável de as repetir e acrescentar!

A ideia de caçar na costa da Serra às perdizes bravas, deixava-me simultaneamente preocupado em não facilitar e excitado com a possibilidade de fazer uma boa caçada. Uma caçada que me deixasse mais uma boa recordação, num local que me é particularmente querido, a Serra d`Aire.

Com o objectivo em mente, preparo todo o material ainda no sábado à noite. Botas e galochas, safões para proteger do mato forte e possivelmente molhado, o impermeável para o caso da chuva aparecer, um colete leve, chapéu de pala comprida para minimizar o impacto do levantar do sol da manhã ou da chuva directa aos olhos, arma passada a óleo e verificada, assim como os necessários documentos. Tudo em ordem. Quanto aos cartuchos, -Nada de cartuchos de chumbo 7 ou 7,5! que utilizo quase sempre nas chamadas perdizes de “borda de estrada”. Assim apelido por vezes, as perdizes soltas hoje em dia em muitas zonas de caça, de véspera ou de madrugada, a partir de um transporte e cujo comportamento e consequente forma de caçar nada tem a ver com a caça à perdiz verdadeiramente brava ou mesmo repovoada atempadamente. Mas isso são contas de outro “rosário”. A escolha dos cartuchos recaiu pelas cargas de 32 g, mas apenas de chumbo 6, com bucha de embalar.

Subsistia ainda alguma dúvida nos cães a levar.

O Pirata, setter inglês com 5 anos e à data o cão mais experiente no canil, não tem andado bem nas ultimas semanas, parecendo-me estar a ficar adoentado (espero eu que não seja Leishmaniose... como aconteceu com o meu último grande companheiro o “Bizarro”ou algo pior). Então acabei por decidir ainda antes de adormecer que levaria a“Joaninha”, perdigueira nacional com um ano. E as duas epanheul breton, a “Bolota”já com dois anos e a “Uva”, cadela também muito dotada, com um ano e meio e cuja dupla tenho ultimamente já ensaiado a caçar em parelha. Seria a estreia delas por ali.

Acordo por essas 05:30h e toca a despachar! É para chegar cedo.

Por forma a não fazer muito barulho e até porque já não sei onde estão “metade das coisas”... preparo-me num ápice, saio à rua, carrego tudo e acomódo as cadelas nas jaulas. Sigo de imediato até ao café da terra, onde tomo o pequeno almoço. Parto de pronto rumo a Vale da Serra, ainda antes da chegada dos habituais clientes, que como eu normalmente ali passam para a “cafezada” matinal e o utilizam como ponto de encontro. Vale da Serra é uma pequena e lindissima aldeia intrincada entre o Arrife (formação rochosa paralela à Serra) e a Serra d`Aire propriamente dita.

Atravesso a povoação e a chegada ao sopé da Serra é feita já com o dia feito.

Opto pela “saída” apenas com a “Joaninha”, cadela de enorme potencial (mas ainda inexperiente) e para já mais “curtinha” nos andamentos, o que poderia proporcionar um levante mais próximo, das perdizes ainda “trôpegas” do frio da noite, coisa que sucede por vezes no Inverno (já em meados/final de época).

No entanto, nada aconteceu durante as primeiras horas, apesar do caçar muito entusiasmado da “Joaninha”, da busca meticulosa da área, e de ter a certeza de ali as haver. Mas pelo menos também não choveu.

O facto de estarmos em meados da época poderia fazer com que as perdizes estivessem ainda mais “subidas” por forma a buscar defesa, ou poderiam estar simplesmente num“canto” qualquer que ainda não tinha “batido”. Não desmanchei também e continuei, com a crença de que seria uma questão de tempo e sobretudo que estaria à altura do que sucedesse. Cerca das 10:00h faço uma passagem pelo carro, descasco uma tangerina, arrepelada à pressa da fruteira, antes de sair de casa, e reponho a “suadela” com os seus gomos suculentos e deliciosamente doces. Saio de seguida com as duas “bretons”.

Não muito depois, numa quota média da encosta, noto as cadelas a ziguezaguear de cabeça alta,procurando a emanação, simultaneamente estimuladas mas cuidadosas, seria algum rasto de outro bicho, ou as perdizes poderiam estar mesmo à nossa frente. Ainda antes de concluir o pensamento... VRRRRRRRRRRR....

Perdiz “nas asas” a cerca de 30-40 m, a descer e com a velocidade típica de perdiz de Serra, para quem a vida nunca foi fácil. Asseguro-vos, numa verdadeira “vertigem”...

Hesito um momento. Talvez por inesperado, pelo levante ser um pouco largo, e porque a cena é magnifíca! Ainda que o tente descrever, não me detenho de exclamar “- Indescritível!”. Num reflexo, que interrompe esse momento de comtemplação, eis que irrompe o tiro, inato, seco e seguro...

Vejo-a quebrar sincronizada ao tiro e desaparecer no limite da minha própria visão, às crutas de uns medronheiros altos, sarapintados, nesta altura, de vermelhos e amarelos intensos.

Gravei a imagem e assaltou-me a ideia de ter ficado “seca”. A referência era fácil, “os medronheiros altos e carregados de medronhos maduros”. “Que lance e que tiro!”,repetia-me o pensamento, com agradecimentos a Deus, a Diana e a Stº Huberto e a todos os que me levaram a estar ali, naquele dia, e naquele momento!
Oriento a descida em diagonal, atingo o ponto onde se terá levantado e percorro depois a sua trajectória. Não estou enganado. Era longe mas ela cruzou os medronheiros altos... começam as dúvidas... e por via das mesmas, muita atenção aos metros que antecederam à chegada aos ditos medronheiros. Já só me imaginava a contemplá-la. Será que as cadelas a conseguiriam cobrar. Ai, o meu “Bizarro”!Cão de caça, magnífico no cobro e, que fez a sua última época o ano passado. Um Breton que caçará comigo seguramente para sempre. Que saudades.

Mas a perdiz caiu mesmo. E estaria “seca”? Assaltavam-me as dúvidas. Tinha já passado adiante dos ditos medronheiros e procurava agora a “porrada” da perdiz. Se tivesse caído, àquela velocidade teria deixado penas no local da “porrada”. Seguramente. Raciocinava eu, tentando-me convencer que aquele tiro tinha sido uma “obra de arte” (...de grande sorte!), mas agora teria de haver perdiz por ali. Mas teria caído mesmo? Pelo menos tinha deixado essa sensação, e como se costuma dizer, “redonda”. No entanto, onde estaria a “porrada”?, mais adiante? Nada. Talvez antes dos medronheiros. Voltei atrás e adiante várias vezes, mais cinquenta, menos cinquenta. Não havia dúvida, que a estar, teria de ser por ali. Às tantas, vejo duas pequenas penas que, pelo seu estado, eram mesmo da perdiz (aquela perdiz!), mas da dita cuja, nada! Teria sido só um “raspão”? Teria ficado apenas“chumbada”, estando agora por ali “encoiçada” nas pedras e mato forte? A verdade é que cerca de 40 minutos depois, de andar ali a pisar o mesmo terreno, decido abandonar a busca e avançar. Estava estarrecido. Bem, afinal de contas, um grande esforço até ali e tudo em vão. Agora era já, mais de meia manhã. E depois de todo aquele trabalho de cobro, das “pequenas penas” que encontrei, levava agora eu uma maior, não restava mais que desistir. As hipóteses começam agora a diminuir face ao tempo disponível.

No entanto, a manhã era de perdiz e naquele terreno, uma manhã dura, e quem desanima, não encontra “fortuna”...procurava eu alguma motivação. Enquanto me libertava das ideias mais desanimadoras dou outra vez com as cadelas a caçar mais interessadas. E eis que a Uva se detém magistralmente, numa paragem expressiva e firme, após o que começa a guiar em curtos ziguezagues. Estava na minha frente e iria sair –aguardava eu! Era tudo o que me vinha à cabeça e tudo o que queria...

Ao mesmo tempo em visão periférica vejo a “Bolota” sair-me à direita a descair numa corrida desenfrada, mas de cabeça baixa e com todo o tipo de que se lhe tinha levantado fortuitamente um coelho. Bem, voltará de seguida, concluí, sem dar grande importância. Com atenção máxima na Uva que à minha frente continuou a caçar com alguns cuidados, mas nada... até que voltamos atrás, umas dezenas de metros, com a idea na localização da Bolota...

Pois, nada de mais, naqueles (alguns) minutos em que procuramos vir ao seu encontro, surge-nos, fazendo o mesmo, mas já não vinha sózinha... a Bolota trazia um grande perdigão consigo!

Confirmo de imediato, que seria o que tinhamos levantado, o mesmo a que tinha atirado e visto cair. O mesmo que procuramos por três quartos de hora, e alegrou o caçar das cadelas em 300 a 400 metros, sempre na nossa frente, e que tinha efectivamente arreado “de asa”.Pois é deu paragem à Uva e terá saído numa correria infernal, que não o tendo visto eu, nem a Uva, deu nas vistas à Bolota, que saiu no seu encalce e que bem o cobrou!

Vermelho! Fortissimo! Que Maravilha... o voo, o tiro, a insistência, o trabalho das cadelas e o cobro. Também, uma boa pitada de sorte...


Antes de voltar a casa decidi tirar uma foto com a encosta da Serra d`Aire em “pano de fundo”, com as companheiras da manhã... e o meu último troféu, um perdigão da Serra d`aire.

A ocasião assim o merecia.
Mais uma excelente manhã de caça na Serra d`Aire! E que repleta de emoções.

Quando já não houver mais“pernas” para caçar ali, restará rever estes momentos.

Apenas uma perdiz, mas daquelas que valem por muitas!


(In Caça & Cães de Caça, Maio 2015)


Posted: 2015/05/07

RAPOSAS – A Magia das Batidas!




            O apelo das batidas

A partir de Janeiro ou já durante o mês de Fevereiro e sempre que as migratórias não acorrem a perturbá-lo, o campo sossega. As manhãs frias e calmas de “final de época”, já sem a presença assídua dos caçadores da menor fazem sentir o apelo das Batidas ás Raposas – em muitos locais assim é, e para muitos caçadores e Associações no nosso País.

Não é a primeira vez que escrevo sobre Batidas ás Raposas. Teimo em considerá-las um tema interessante. Assim penso. Por esse motivo tenho igualmente esperança que não seja a última... Esses momentos de recato, uma pequena parte do tempo gozado em análises e sonhos, alguns deles até já vividos, permitem o reconhecimento das Batidas ás Raposas, como uma modalidade de caça de ingredientes únicos.

 

As batidas ás raposas são mais que sair ao campo em grupo


As batidas ás raposas são mais que sair ao campo em grupo, munidos de armas, sem qualquer preparação, nem noção do que irá acontecer, nem quando, nem onde, nem porquê... enfim faltas de mais para que de facto faça sentido.

O planeamento atempado, a organização, a coordenação do mais fino detalhe, a caça no posto e na linha de Batida (em perfeita reciprocidade), a expectativa e sobriedade de quem caça emboscado, a alegria e brio de quem tem por missão fazer as raposas cruzarem ás portas, não podem estar sequer parcialmente ausentes das Batidas. Após a caça, a demonstração de honra e respeito, á espécie, aos caçadores, aos batedores e a todos quantos colaboraram, expressos na vontade em participar de uma recordação, de constar de uma foto ou de vivificar a “sorte” através de um trofeu, mais do que desejável, deverá suceder com gosto e espontaneidade. Por último, como ingrediente derradeiro, o momento de todos comemorarem em conjunto, culmina á mesa uma tradição cinegética singular e pouco comum noutras modalidades.



Não fugir aos ingredientes e evitar improvisos


Nas Batidas e independentemente do papel que ocuparmos é importante sentirmos todos os aspectos mencionados acima. É certo, que nem sempre assim será ... . Como na confecção de um receita de culinária a falta de um ingrediente, por mais que se diga “secundário” ou menos importante para o resultado final, não deixa o prato ser degustado na sua plenitude. De forma mais pragmática, as questões de falta de planeamento e organização podem conduzir a falhas de segurança, levam a coordenação e encadeamento deficiente das acções, indecisões, erros, falta de controlo, etc. Por sua vez, estes aspectos subtraem confiança e concentração a quem fica nas portas. Aos batedores sucede idêntica propagação ao seu empenho. Alguns dos participantes, em jornadas assim (des)organizadas nunca mais voltam. E finalmente, na realidade, não se caçou verdadeiramente. Em consequência, não pode existir prazer, nem necessidade de prestar honra ou de respeitar, o que no fundo não se respeitou. Por isso, não há qualquer motivo para o que quer que seja. Assim os resultados são com frequência maus, a vários níveis. O improviso é por isso, de todo evitável. Ou seja, não poupar esforços em organizar bem e cumprir com o planeado é fundamental. Não improvisar trará melhores resultados e maior consistência.



De forma resumida podemos considerar um conjunto de factores todos eles importantes associados á realização das Batidas ás Raposas:



A razão da Batida


 - Argumentos



A Organização


 - Aspectos legais

 - Aspectos funcionais

 - A coordenação

- A alimentação


A Segurança


 - A segurança como um todo (transportes, acondicionamento de armas, munições, bebida, etc.)

 - Marcação das portas ou colocação dos postos

 - Roupa/coletes de alta visibilidade para os batedores

 - Mapa das áreas a bater


O Comportamento do Caçador, do Batedor e restantes envolvidos


 - Empenho e Concentração nos papeis que cada um ocupa

 - Devemos recordar antes da saída para o campo o que é esperado de cada um, qual deve ser o comportamento


Quadro de Caça e Convívio


 - O quadro de caça e as fotos de grupo, para além de uma manifestação de respeito, fomentam o gosto pelas Batidas

 - Os convívios proporcionam a troca de experiências, das histórias, do próprio conhecimento e fortalecem o espírito de grupo e vontade de continuidade.


Factores contextuais e motivacionais nas batidas




Como referi inicialmente, não foi a primeira vez que escrevi sobre as Batidas ás Raposas, no entanto sempre que o fiz, sobressaiu o enfoque quase exclusivo na realização prática, nas acções de planeamento, de organização, de comportamento e escolhas associadas ao acto de caça. Desta vez, a partir destas linhas, espero que tenha ressaltado, que a realização desses factores contextuais, a que chamei figuradamente ingredientes, é fundamental para o desenvolvimento de factores motivacionais (e emocionais) sobre a caça á raposa. Estes últimos, tão importantes, dependem da existência ou satisfação dos primeiros. O gosto pela Raposa e pelas Batidas pode ser ensinado e transmitido, no entanto tem de se partir de bases sólidas, de uma plataforma de conhecimentos práticos, da sua aplicação de forma empenhada e contínua. Como reflexo desse facto, surgirão o apreço, o interesse, o prazer, a paixão pela raposa e pelas Batidas, por parte de um conjunto de “frequentadores”, alguns que apenas se iniciaram por curiosidade ou “por arraste”.

Comentários Finais

Como se percebe facilmente, tornar uma actividade colectiva de caça atractiva ou apreciada, no caso específico das batidas ás raposas, sobre a qual existiu e existe algum desenraizamento, não é coisa que se faça de um dia para o outro. Essa é tarefa que envolve grande esforço de organização e dedicação. No entanto, só através da continuidade se conseguirá garantir dinâmica e cultura em torno das batidas. Não basta sequer fazer uma vez bem, temos de mostrar regularidade, e esse é, e deverá ser o desafio, por parte de quem tem responsabilidades de organização. Uma má experiência tende a marcar-nos mais que um acontecimento positivo. É por isso importante minimizar riscos e incertezas, quando queremos proporcionar uma boa jornada de batida a caçadores e batedores, ou quando simplesmente a queremos usufruir como caçadores, ou mais importante ainda quando queremos cativar ou aumentar o conjunto de apreciadores dessa modalidade de caça. Actualmente, estes aspectos são ainda mais importantes, face a uma oferta diversificada e atractiva de modalidades “concorrentes”, assim como pelo perfil dos jovens caçadores.

 Ao longo dos anos tive a felicidade de conhecer as Batidas em vários papeis, desfrutando das mesmas de variadas formas. Pessoalmente, as batidas sempre me suscitaram enorme prazer. Como batedor, como organizador, como caçador, procurei compreender e corresponder ao que se espera de cada um destes papeis. Quero crer que senti o que terão sentido muitos outros companheiros e amigos, por certo! Agradeço por isso, em todos esses papeis, a todos esses amigos sem os quais as Batidas não teriam sido a experiência em que se tornaram. Desde o inicio, passaram-se de facto muitos dias de dedicação. É através dessa experiência e da convivência com apreciadores, também eles aficcionados das Batidas e da Raposa, que tenho construído a opinião aqui expressa e que não considero tão pouco exclusiva.


Em plena época de batidas, não hesite sequer um momento, planeie, organize, coordene a realização das batidas na sua zona de caça ou frequente locais onde o façam, com paixão e empenho. Vai ver que “essas” batidas proporcionar-lhe-ão uma jornada inesquecível. Se nunca o tinha feito prepare-se para desfrutar das Raposas e sobretudo... da Magia das Batidas!








Locais de tradição
Ao longo dos anos, através das batidas ás raposas conhecem-se também locais fantásticos. Com as Raposas em mente, esta época em particular conto regressar á aldeia de Vale Alto, e á magnífica Serra de Minde. A própria tradição “Raposeira” desses locais torna a caça á raposa e a vivência das Batidas uma genuína maravilha. As paisagens e o coração das gentes que se conhecem (ou se re-encontram) complementam mais uma excelente receita de caça, em final de época – um regalo para os sentidos!


 (in Caça & Cães de Caça, Março, 2011)









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